Resumo: O presente trabalho conceituará o instituto da denúncia espontânea, bem como seus pressupostos, concentrando a discussão da sua aplicação no descumprimento de obrigações tributárias acessórias à luz da doutrina e jurisprudência pátria.Palavras-chave: Denúncia espontânea. Obrigação acessória.I - INTRODUÇÃOA denúncia espontânea de infrações é instituto do direito tributário previsto no art. 138 do Código Tributário Nacional (CTN), caracterizando-se por ser uma espécie de privilégio legal para os contribuintes que cometeram ilícitos tributários e, ante a possível imposição de sanção pela Administração Tributária, resolvem confessar a prática de infrações visando livrar-se das pesadas multas tributárias.Este trabalho abordará o conceito e os pressupostos da denúncia espontânea e, em seguida, tratará das controvérsias doutrinárias e jurisprudenciais que envolvem sua aplicação, concentrando a discussão na inaplicabilidade da denúncia espontânea no descumprimento de obrigações tributárias acessórias.II – CONCEITO E PRESSUPOSTOS DA DENÚNCIA ESPONTÂNEAA denúncia espontânea é um instituto de direito tributário com o objetivo de incentivar o contribuinte que infringiu a lei a regularizar sua situação antes do conhecimento da infração pelo fisco.O art. 138 do CTN determina: Art. 138. A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração. Parágrafo único. Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração.A partir da interpretação do artigo acima transcrito extrai-se os pressupostos de admissibilidade da denúncia espontânea, que são: a tempestividade (momento da comunicação ao fisco), que deverá ser acompanhada, se houver, o pagamento e antes de qualquer procedimento fiscal.Uma vez que, elevada a denúncia espontânea à condição de instituto jurídico tributário, é certo que não se equipara a mera notícia do descumprimento da legislação. Não se exige especificamente formalidade, mas é indispensável, como observa Paulsen1, que o contribuinte declare a infração cometida e efetue o pagamento imediato do tributo e dos juros moratórios.Apesar de ser um dever por parte do contribuinte cumprir com as obrigações tributárias, a denúncia espontânea foi inserida pelo legislador tributarista na criação do Código Tributário Nacional com a finalidade de incentivar o sujeito passivo a facilitar a arrecadação concedendo-lhe o benefício da exclusão da responsabilização por qualquer infração. É esse o escólio de Ataliba: É princípio processual tributário universal – também consagrado no Brasil, com profundas raízes do nosso espírito jurídico e nos mais sábios preceitos de moralidade administrativa – que procurando o contribuinte espontaneamente as autoridades fiscais para proceder a retificação em declarações anteriormente feitas, ou levar ao conhecimento da administração tributária atrasos, enganos, omissões, irregularidades e erros por ele mesmo cometidos, não fica por isso sujeito a nenhuma penalidade, excluindo-se a configuração... A sistemática tributária, ao lado de inúmeras outras medidas de variada natureza – tendentes a facilitar a ação arrecadadora e tendo por finalidade estimular o comportamento do contribuinte, no sentido de cumprir suas obrigações tributárias. (ATALIBA, Geraldo. Fisco e Contribuinte. ano XXIV. nº 11, nov/1968, p. 664; DESLANDES, Rosenice. Denúncia Espontânea. 1ª. ed. São Paulo: Ed. Forense, 1997, p. 14).Observe-se, ainda, que a espontaneidade é aquela iniciativa que parte do próprio agente, sem que seja induzido ou compelido à prática do ato que somente cessará no momento em que for iniciado um procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração. Depreende-se, portanto, que deve haver procedimento formal no âmbito da administração tributária, delimitando especificamente os tributos e os períodos de análise de sua regularidade. Essa interpretação garante que o contribuinte possa manter a situação de espontaneidade quanto a outros tributos, a par do efetivamente investigado.Sobre o tópico, lembra Luciano Amaro: Por outro lado, não basta o início de qualquer procedimento ou a existência de qualquer medida de fiscalização por parte da repartição fiscal competente para apurar a infração praticada. É necessário, além disso, que a atuação do Fisco esteja relacionada com a infração, no sentido de que o prosseguimento normal dos trabalhos tenha a possibilidade (não a certeza) de identificar a prática da infração. Se a medida de fiscalização diz respeito limitadamente ao exame de determinado assunto, e a infração se refere à matéria estranha àquela que esteja sendo objeto da investigação, a espontaneidade não estará afastada. (AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 452).Anote-se que além da existência de procedimento formalmente instaurado, é necessária a efetiva ciência do sujeito passivo para fins de cessação da espontaneidade, pois um processo administrativo pode correr por anos sem o conhecimento do contribuinte.Na esfera federal, o legislador regulou expressamente o parágrafo único do art. 138 do CTN por meio do art. 7º, do Decreto nº. 70.235/72 e § 1º, nos seguintes termos: Art. 7º O procedimento fiscal tem início com: I - o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto; II - a apreensão de mercadorias, documentos ou livros; III - o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada. § 1° O início do procedimento exclui a espontaneidade do sujeito passivo em relação aos atos anteriores e, independentemente de intimação a dos demais envolvidos nas infrações verificadas.Anote-se que, conforme acima descrito, os atos que iniciam o procedimento geram ciência do sujeito passivo. Feitas essas considerações preliminares, a seguir será analisado o cabimento do instituto da denúncia espontânea no descumprimento de obrigações tributárias acessórias.III – A APLICAÇÃO DA DENÚNCIA ESPONTÂNEA NO DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES TRIBUTÁRIAS ACESSÓRIAS: POSIÇÕES DOUTRINÁRIAS E JURISPRUDENCIAIS.O Código Tributário Nacional define que as obrigações tributárias dividem-se em principais e acessórias, conforme art. 113 e seus parágrafos. As obrigações acessórias, também chamadas de deveres formais ou instrumentais, estão compreendidas no artigo citado, correspondendo às condutas de fazer ou não fazer, sendo seu descumprimento sujeito a penalidades pecuniárias. Sua finalidade é facilitar a fiscalização e, por conseguinte, a arrecadação.Parte da doutrina tributarista pátria entende que a denúncia espontânea seria aplicável, também, ao inadimplemento de obrigações tributárias formais ou acessórias, fundamentando o entendimento, essencialmente, na interpretação literal do art. 138 do CTN, que aduz que “responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora”.Com efeito, a expressão “se for o caso” abriria a possibilidade de denúncia espontânea em situações onde não há pagamento de tributo, o que corresponderia às obrigações formais.Encampando a tese, Hugo de Brito Machado preleciona: Como a lei diz que a denúncia há de ser acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido, resta induvidoso que a exclusão da responsabilidade tanto se refere a infrações das quais decorra ou não pagamento do tributo como as infrações meramente formais, vale dizer, infrações das quais não decorra o não pagamento do tributo. Inadimplemento de obrigações tributárias meramente acessórias. (MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 28ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008a. p. 92).Assevera, ainda, o doutrinador que o cumprimento de uma obrigação acessória fora do prazo legal configura uma forma de denúncia espontânea da infração, afastando a responsabilidade do sujeito passivo.Leandro Paulsen2 aduz que a não aplicação do art. 138 do CTN às obrigações acessórias inibe a própria eficácia do dispositivo relativamente às obrigações principais. Isso porque há obrigações acessórias, como a expedição de nota fiscal, cujo descumprimento enseja aplicação de multas de alto valor. Se o contribuinte não puder denunciar a infração da não expedição da nota e o não pagamento do respectivo tributo, restando apenas a opção de pagar com juros, ficará necessariamente silente, já que, fazendo a denúncia, estaria atraindo para si aplicação da multa pelo descumprimento da obrigação acessória. Nesse sentido: Não há razão, legal ou mesmo finalística, que possa embasar satisfatoriamente a não aplicação do art. 138 do CTN às obrigações acessórias. Pelo contrário, a expressão “se for o caso”, constante desse artigo, cumpre justamente este papel integrador das obrigações acessórias, deixando claro que nem sempre o cumprimento da obrigação tributária implicará pagamento de tributo, pois há os simples deveres formais de fazer, não fazer ou tolerar que caracterizam obrigações acessórias. (PAULSEN, Leandro. Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 9.ed. São Paulo: Livraria do Advogado, 2007, p. 992).Na mesma linha: Em escorço, este art. 138 elide a responsabilidade pela prática de infrações tributárias substanciais e formais (quaisquer que sejam), exonerando o agente infrator de multa de toda espécie. (José Jayme de Macedo. Código Tributário Nacional: Comentários, doutrina e jurisprudência. São Paulo: Saraiva, 1998).É sabido que o descumprimento de obrigação principal impõe além do pagamento do tributo não pago, e do pagamento dos juros e da correção monetária a inflação de uma multa, comumente chamada de moratória ou de revalidação e que o descumprimento de obrigação acessória acarreta tão somente a imposição de uma multa disciplinar, usualmente conhecida pelo apelido de ‘isolada’. Assim, pouco importa ser a multa isolada ou de mora. A denúncia espontânea opera contra as duas. (POLONI, Antonio S. Denúncia espontânea, multa de mora e o parcelamento de débito. Disponível em:
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